domingo, 20 de novembro de 2011

Os efeitos terapêuticos das estórias infantis - Luciana Figueiredo

O momento de contar histórias é, acima de tudo, uma fonte de prazer e contribui de forma ímpar para o desenvolvimento social, cognitivo e emocional da criança. O simples ato de narrar um conto de fadas permite a criança vivenciar uma aprendizagem significativa, trabalhando-se o lúdico e o imaginário infantil. 

De acordo com Bettelheim (2006), o conto de fadas é psicologicamente mais convincente do que a narrativa realista, porque coloca a criança frente a uma situação-problema cuja solução ela encontrará a partir da sua capacidade de imaginar.  Ao narrar uma estorinha, podemos colocar a emoção na entonação da voz e possibilitar que a criança passeie e interaja com os personagens, falando sobre o que ela acredita que irá acontecer. Desta forma, o conto de fadas terá um efeito terapêutico na medida em que a criança encontra uma solução para sua situação-problema, ou seja, seus medos e angústias. É como se a criança, ao sentir-se atraída pela narrativa, não se deixasse abater pelos seus problemas reais e experimentasse lutar contra as dificuldades da vida. É através dos efeitos heroicos e das palavras mágicas que a criança, de modo inconsciente, acredita que também poderá encontrar força para enfrentar suas dificuldades na vida. Segundo Bettelheim (2006), o conto de fadas diz à criança de que maneira ela pode viver com seus conflitos sugerindo-lhe fantasias das quais jamais ela seria capaz de inventar por conta própria. Fantasias essas que Radino (2003) define como nosso combustível interno. De acordo com suas afirmações, desde o nascimento, para que seja possível sobrevivermos psiquicamente, passamos a criar fantasias necessárias para dominar nossas angústias e realizar nossos desejos. De outra forma, seríamos esmagados por nossas angústias. O autor acrescenta que os contos de fadas dão forma aos seus desejos e emprestam-se como cenário de seus sonhos, aguçando a imaginação e favorecendo o processo de simbolização da criança. 

Para Bettelheim (2006), o conto de fadas é fundamental para a formação da criança, porque permite à criança experienciar a fantasia, a magia, o símbolo e o seu significado como um canal de acesso ao seu inconsciente, dando asas à imaginação, e possibilitando-lhe distinguir o real e o irreal, consentindo estabilizar afetos conflitantes, configurando claramente o justo e o injusto, o bom e o mal. Isso tudo só é possível porque estas narrativas possibilitam de modo inconsciente, através do “faz de conta”, acessar processos internos que ocorrem na parte mais íntima de um ser, na essência do seu sentir e do pensar. E as crianças por serem extremamente sensíveis entendem perfeitamente a linguagem dos símbolos presentes nos contos, pois as inventam no seu dia-a-dia no jogo do “era uma vez” e, seguem com a garantia transmitida pelos contos que assim como a princesa sofreu por toda a estória e teve um final feliz, ela também conseguirá ter um final feliz ao encontrar uma solução para lidar com suas angústias. 

E não é por acaso que em meio a tantos contos, a criança se identifica com um, e pede para a mamãe repetir incansavelmente a mesma estória ou parte dela.      

BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. 21. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006.
RADINO, Glória. Contos de fadas e realidade psíquica: a importância da fantasia no desenvolvimento. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.

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